"Opinião virou pensamento”, reclama Michel Maffesoli

“O que difere a espécie humana de outros animais é a capacidade de contar histórias, mas atualmente os guardiões das palavras dão mais atenção à forma do que ao conteúdo.A raça humana está perdendo a capacidade de dar sentido às coisas passando pela palavra.” Esse é atualmente o maior problema da sociedade na visão do cientista social Michel Maffesoli.

“Estão mais preocupados com a forma, a moldura, do que valorizar o conteúdo”, atacou o francês.

Michel Maffesoli falou na primeira edição do Fronteiras do Pensamento e criticou a obrigatoriedade de a filosofia abordar o que é politicamente, teoricamente e sociologicamente correto. “Desde os tempos greco-romanos, a filosofia se opôs à opinião comum. Hoje, a maioria do que se apresenta como pensamento não passa de um conjunto encantado de palavras”, desabafou. E sentenciou: “Opinião virou pensamento”.

O francês explicou à plateia presente no Salão de Atos da UFRGS que é essa a fronteira que o pensamento contemporâneo deve ousar ultrapassar. “A fronteira, o limite, são maneiras de acessarmos uma outra coisa”, sugeriu.

A mudança de paradigma na produção acadêmica só vai acontecer quando o pensamento deixar de ser crítico para tornar-se radical, acredita o francês. “O verdadeiro pensamento questiona sempre, não traz necessariamente respostas, mas sabe colocar os problemas”, disse, citando Hannah Arendt e Aristóteles.

“Os grandes pensadores da humanidade foram radicais: Marx, Jung, Freud e, recentemente, meu amigo falecido Jean Baudrillard”, observou Maffesoli, que acrescentou que o pensamento crítico é conveniente.

Radicalismo e memória

Analisando a etimologia da palavra radicalismo, Michel Maffesoli chegou ao termo raízes, o que garante a existência de qualquer coisa, acredita o francês. “Uma sociedade só existe por suas histórias, tradições.” Ou seja, por sua memória.

A sociedade atual se opõe à tradição judaico-cristã de procurar no além, no longínquo, o objetivo da vida, a perfeição. “Hoje, nosso ideal é próprio da Terra e não do céu.” Segundo Maffesoli, o que está em jogo é a busca voltada para gozar o presente. “Não tente ir além, realize-se aqui e agora.”

O mito da sociedade moderna, na opinião de Maffesoli, foi o progresso. “A característica da modernidade foi o processo de desenraizamento das pessoas e das coisas.” Por vivermos o pós-modernismo, experienciamos uma nova situação, da busca desses extratos renegados no passado.

“Aprendemos a opor progresso e regresso, por isso não utilizo essa palavra, que possui conotação negativa”, observou, para em seguida anunciar o termo que prefere: ingresso. “A energia de dentro, interna”, complementou.

“Temos que ter a audácia de pensar, de sermos claros”, desafiou. E disse que um dos sintomas da contemporaneidade pouco difundidos é um retorno ao arcaísmo. “Ao dionisíaco, ao nomadismo, às tribos.”

Filosoficamente, essa é uma questão difícil de ser pensada, explicou, pois nossa sociedade aprendeu a consagrar o sujeito como centro do mundo. “Mas, assim como aceitamos a morte de Deus, devemos aceitar a morte do sujeito”, concluiu.



Fonte: Fronteiras do Pensamento

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